quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Uma no ferro, outra na ferradura

Há exato um ano, em Londres, a CSN tentou adquirir em leilão o controle da anglo-holandesa Corus. A brasileira ocupava a 49ª colocação no mercado mundial. Acossava um gigante 40 posições à frente no ranking, com quase cinco vezes mais empregados e mais que o triplo de produção de aço. A proposta foi de US$ 11,24 bilhões. Não vingou por pouco _mais precisamente, por US$ 90 milhões a mais que a indiana Tata Steel ofereceu.
O governo lamentou em silêncio. Tinha o diagnóstico, correto, de que o cenário globalizado pedia/exigia venturas de países emergentes. O próprio Lula estimulou em discursos que capitalistas brasileiros olhassem além da fronteira.
Neste 30 de janeiro, porém, o noticiário flagra o Planalto empenhado em frear a expansão de outro grupo privado: a Vale, que sonha arrematar a anglo-suíça Xstrata.
Estranho. Os ventos nesse ambiente de negócios não mudaram. Pelo contrário, cada vez mais players do "Terceiro Mundo" atacam os mercados dos EUA e Europa. A "Economist" contou 200 em 2008.
Estranho. O passo da mineradora parece tão ou mais "natural" do que o da siderúrgica. Vice no setor, ela mira na 6ª maior _até porque a líder, a BHP, mexe-se para adquirir a 3ª, a Rio Tinto. Com a Xstrata, a Vale conseguiria também a diversificação de ativos (níquel e cobre).
Estranho. Talvez não haja no país uma empresa e um executivo tão próximos do lulo-petismo quanto a Vale e seu CEO, Roger Agnelli.
Os despachos dão conta de que Lula teme que a Vale repita a Ambev e exporte o birô decisório e os novos investimentos. Mas, nesse meio tão competitivo, por que ela renegaria uma base tão rica em reservas e sem concorrentes?
Duas hipóteses são mais prováveis. Ou o Planalto está inseguro com o pós-crise dos EUA e estrila para "proteger" o dinheiro estatal e paraestatal aplicado na Vale. Ou joga apenas para arrancar mais um "doce" do velho companheiro.

coluna de 30.jan.2008

mfilho@folhasp.com.br

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Lula lá e cá

Arrisca-se a quebrar a cara quem projeta efeitos das eleições municipais sobre a sucessão presidencial. A votação nas cidades geralmente diz mais respeito ao ciclo eleitoral anterior do que ao seguinte _a ajuda ou a bênção de governadores e/ou congressistas pesa bem mais do que a perspectiva de um novo ocupante no Planalto. Mas é difícil não cair na tentação.
Primeiro porque os nomes mais fortes da oposição à Presidência têm problemas neste ano em suas capitais. Aécio Neves ainda não achou candidato em Belo Horizonte; José Serra precisa eliminar um de dois em São Paulo (de preferência o favorito, Geraldo Alckmin).
Segundo devido ao ineditismo da eleição de daqui a dois anos: a primeira do lulismo sem Lula. Os partidos da base vão colher nas urnas em 2008 a munição para interferir nas negociações da(s) chapa(s) _ou do espólio_ da aliança em 2010.
E terceiro porque, ao contrário do que dizem e do que ele gostaria, o presidente não poderá se ausentar totalmente da campanha neste ano _ou, ao menos, da pré-campanha.
Há a já comentada situação em São Paulo, em que só um chamado de Lula convencerá a ministra Marta Suplicy a impedir a varrição do petismo "de luta e de massas".
O cenário é similar ao de BH, ainda que lá o PT esteja no poder. Por mais camaradas que façam questão de parecer, Aécio e Lula têm projetos políticos distintos. Por que este permitirá àquele redefinir sozinho as fronteiras da política de boa vizinhança em Minas? Patrus Ananias, como Marta, não quer, mas poderá acabar convocado também.
Há cidades, como o Rio, em que o dedo do presidente ajudará a desembaçar o pára-brisa.
E há, por fim, questões do PT em jogo. A direção em Pernambuco, por exemplo, se opõe ao prefeito João Paulo, que evidentemente deseja fazer o sucessor em Recife. Quem no partido tem bala para arbitrar pinimbas como essa? Ricardo Berzoini certamente que não.

coluna de 02.jan.2008

mfilho@folhasp.com.br