sexta-feira, 19 de junho de 2009

O velho truque do baralho novo

A repentina ideia de escalar Ciro Gomes para disputar o governo de São Paulo tem uma consequência imediata. Força os institutos de pesquisa a lidar com o "fato novo" estadual e, com isso, praticamente garante um impulso à candidatura nacional de Dilma Rousseff.
Há duas maneiras principais de construir um nome para uma eleição majoritária: torná-lo conhecido e valorizar os seus atributos.
Para divulgar o nome da ministra, existe pouco a fazer além do que tem sido feito desde o ano passado. A "caravana do PAC" não pode visitar dois lugares ao mesmo tempo.
Quanto às virtudes, por ora estão em jogo as que Dilma tomou emprestadas de Lula. E estas já são mais do que sabidas e valorizadas.
Se nada mudar, governo e PT apostam que Dilma continuará a crescer em 2009, mas menos rapidamente do que até aqui. Por isso a conveniência de uma "novidade".
O triunfo sobre o câncer linfático poderia fazer essa função catalisadora. Mas ele não poderá ser anunciado antes de setembro _e não há certeza quanto à adequação do uso eleitoral da imagem da ministra assim que encerrar a quimioterapia.
Não há contraindicação, porém, para o "transplante" de Ciro e para a mudança artificial das cédulas que Datafolha, Vox Populi e Ibope submetem a seus entrevistados.
As intenções de voto em Ciro para a Presidência tendem a migrar para a outra candidata da base lulista. Mas, ainda que se dividam igualmente entre os principais concorrentes, será fácil promover a boa "notícia": "Dilma chega a 30%!".
Resta saber por que Ciro, líder nas pesquisas nacionais em alguns cenários, não recusou de bate-pronto o papel secundário em São Paulo.

Será a birra antiga de Serra? Inapetência? Deferência a Lula? Ou finalmente lhe caiu a ficha de que nunca foi o Plano B do Planalto, de que nem no próprio partido é o favorito do presidente e de Dilma (o privilégio cabe ao governador pernambucano, Eduardo Campos)?

coluna de 19.jun.2009

melchiades.filho@grupofolha.com.br

terça-feira, 16 de junho de 2009

Vanguardas e atrasos

Talvez seja cedo para decretar a débâcle de José Sarney ou sentenciar que o ex-presidente da República cometeu um erro ao reassumir a direção do Senado.
É verdade que a Casa vive momento de total descrédito, colhida por uma avalanche sem precedentes de denúncias _de nomeações secretas a servidores fantasmas, de mansões ocultas a aviões fretados.
É igualmente verdade que Sarney está afundado até o pescoço nos escândalos. A cada semana, precisa repetir um "eu não sabia". Já teve de pedir desculpas, divulgar seu contracheque e devolver dinheiro.
Mas é verdade, também, que, graças à vitória de Sarney em fevereiro, o chamado "PMDB do Senado" voltou a capturar a atenção de Lula. O Planalto, que costuma desdenhar do Legislativo, não poderá ignorar o grupo que terá o controle da CPI da Petrobras, ameaça potencial à candidatura de Dilma Rousseff.
Assim como é verdade que, da privilegiada posição no Congresso, o ex-presidente pôde zelar por sua rede de influências no setor de energia. Uma lei foi aprovada para permitir à Eletrobrás fazer compras a toque de caixa. O sarneyzista Edison Lobão é o ministro envolvido na regulação do pré-sal.
É verdade, ainda, que a PF ficou mais "republicana" e diminuiu a publicidade dos inquéritos que investigam obras nos Estados em que o clã Sarney atua (Operação Navalha) e transações financeiras de empresas da família (Boi Barrica).
Por fim, é verdade que, desde fevereiro, o TSE julgou três governadores e beneficiou o PMDB nos três casos. Derrotada nas urnas, Roseana Sarney levou o Maranhão no tapetão.
Como se vê, Sarney segue ocupado com o exercício do poder. É isso que o move, não os aplausos _nunca os recebeu, nem pela transição para a Nova República. Será uma surpresa se ele entregar os pontos porque a "biografia foi manchada" pelos vícios do Senado. É mais provável que a apoplexia dos últimos dias seja o preparo do contra-ataque.

coluna de 16.jun.2009

melchiades.filho@grupofolha.com.br

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Minc e o cérebro

Carlos Minc levou bronca de Lula, foi enquadrado por Dilma e ouviu até palavrão de colegas de governo. Mas o Planalto deve um enorme favor ao ministro por ter provocado tanta "algazarra".
Minc foi escolhido para substituir Marina Silva só porque topou o papel de carimbador expresso de obras de infraestrutura. Tem seguido o roteiro, aliás. As usinas de Jirau e Santo Antônio, por exemplo, receberam sinal verde apesar dos senões de técnicos do Ibama.
Daí a surpresa que causaram as "denúncias" do ministro do Meio Ambiente de derrotas em sua área, notadamente a medida provisória que regulariza a posse de terras na Amazônia. Foi Lula, afinal, quem produziu a "MP da Grilagem". E foi a base governista na Câmara que aprovou a redação final. Durante semanas, somente uma voz no PT se elevou contra a manobra: não a de Minc, mas a de Marina Silva.
Chegou-se a temer que os desabafos repentinos do ministro pudessem estragar o balanço do PAC. Exagero. Como embaraçar uma cerimônia que anuncia como "concluída" uma rodovia entregue à iniciativa privada, ainda que nenhum quilômetro tenha sido asfaltado? Dilma Rousseff nem piscou, claro, ladeada de reverentes companheiros da Esplanada, numa espécie de Santa Ceia do primeiro escalão.
Diminuído, Minc recuou. Disse que antes de tudo era um "homem do governo" e que havia opinado em nome de "amigos e eleitores".
Podia até ser. Mas o esperneio do ministro acabou jogando a crise no colo do Senado, só porque a "MP da Grilagem" lá tramitava naquele momento. Logo os senadores, que nem relaram no conteúdo do texto...
Se agora atender ao "apelo" do ministro e fizer algum ajuste no decreto, Lula sairá revigorado da confusão que armou. Se sancioná-lo sem vetos, a culpa será do agronegócio, do DEM, do Congresso... Marina defendia o ambiente com mais vigor, mas Minc lava mais verde.

coluna de 12.jun.2009

melchiades.filho@grupofolha.com.br

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Corpo estranho

À medida que o nome da "mãe do PAC" ganha corpo nas pesquisas, Lula e o PT deixam de se preocupar apenas com a campanha e os cenários eleitorais para discutir também o loteamento de espaços num governo Dilma Rousseff.
Isso é colocar o carro à frente dos bois, dirá o leitor, já que a ministra ainda não tem nem a metade das intenções de voto do principal adversário. Para os interessados, porém, são medidas de precaução, naturais diante da artificialidade com que a candidatura foi concebida.
Em boa medida, Dilma entrou e cresceu no governo federal por acaso. Assumiu a pasta de Minas e Energia só porque, na última hora, ruiu um acordo com o PMDB. Foi para a Casa Civil só porque José Dirceu não resistiu ao mensalão.
Ela não teve de passar pelo crivo dos políticos ou da sociedade civil. Jamais disputou eleição. Nunca se interessou pelas atividades internas do PT (possivelmente estaria até hoje no PDT, se os brizolistas não tivessem rompido com o governo gaúcho do petista Olívio Dutra, no qual era secretária). O tempo todo foi Lula quem a bancou.
Por isso, dentro da enorme e heterogênea aliança que a defende para a Presidência, poucos sabem de fato quem ela é, o que pensa e, sobretudo, como reagiria no poder.
Daí a preocupação de garantir um "fio-terra" lulista para o caso de vitória. Nos últimos dias, aumentaram os sinais de que Dilma será cercada de pessoas do círculo de confiança de Lula e do PT. O chefe de gabinete Gilberto Carvalho, por muito tempo cotado para presidir o partido, e o ex-ministro Antonio Palocci, que ensaiou se candidatar ao governo de São Paulo, permaneceriam no Planalto em 2010 a fim de assegurar posições em 2011.
O PT, também, opera uma inédita pacificação das correntes internas. Unidas, elas teriam mais condições de negociar cargos, verbas e projetos com a eventual presidente.
O senão é que Dilma, animada, também já quer escolher os seus.

coluna de 05.jun.2009

melchiades.filho@grupofolha.com.br

terça-feira, 2 de junho de 2009

Serra, serra, serrador

José Serra manteve a liderança isolada nas intenções de voto para a Presidência e viu melhorar a avaliação de sua administração em São Paulo. Mesmo assim, a mais recente pesquisa Datafolha não chega a ser boa para o tucano.
Primeiro, a crise econômica (falta de crédito, alta do desemprego, inadimplência crescente) não arranhou a imagem do governo federal.A popularidade de Lula voltou ao patamar recorde (69%). Portanto, se o país sofrer outro abalo daqui até 2010, nada garante que a oposição conseguirá capitalizá-lo.
Segundo, a candidata de Lula confirmou o potencial. A desvantagem de Dilma Rousseff caiu de 30 para 22 pontos (38% x 16%). Deve cair mais. Um terço dos entrevistados ainda não sabe quem é ela. A campanha escancarada, com forró em Caruaru etc., cuidará disso.
Terceiro, o Datafolha fragilizou Aécio Neves _ele aparece atrás de Ciro Gomes (PSB) e de Dilma e empatado com Heloísa Helena (PSOL). Interessava aos serristas turbinar o governador mineiro e convencê-lo a compor uma chapa puro sangue, e não o ver sair apequenado e focado em seu Estado.
Os tucanos otimistas dirão que Serra está ainda recolhido, e que por isso seus números são ótimos e o futuro a ele pertence. Mas o que o governador terá a oferecer quando sair do recolhimento? Provavelmente menos do que o Planalto.
A expectativa de poder não basta mais para atrair apoios. Os PMDBs já deixaram claro que pretendem ficar com o candidato do governo (sugando a máquina enquanto puderem), certos de que serão chamados para assegurar a "governabilidade" não importa o vencedor.
Por fim, o Datafolha complicou até a "saída por cima". Será difícil para Serra renunciar à corrida nacional alegando necessidade de garantir São Paulo para o PSDB. A pesquisa revelou um PT débil no Estado e, mais, que Geraldo Alckmin faria o mesmo serviço (no primeiro turno) para os tucanos.

coluna de 02.jun.2009

melchiades.filho@grupofolha.com.br