sábado, 31 de maio de 2008

Paulinho da forca

O protesto enfático de Inocêncio Oliveira (PR-PE) não deve ser levado ao pé da letra. A Câmara dos Deputados opera "por default" para salvar os seus. O próprio corregedor, que em público faz questão de mostrar indignação, demorou 15 dias para encaminhar o processo contra Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), depois de ter prometido "48 horas, no máximo".
Do mesmo modo, porém, não se deve achar que o cambalacho foi decretado só porque a Comissão de Ética pediu tempo para avaliar se acolhe ou não o pedido de cassação.
Muita coisa contribui para a degola do dirigente da Força Sindical.
Paulinho está no primeiro mandato. Não teve tempo de costurar uma teia de relações como a que salvou Renan Calheiros em 2007.
Pelo contrário, causou má impressão nesse ano e meio no Congresso. Seja por repetir que nada de importante acontecia ali e endossar o discurso dos "300 picaretas" de Lula, seja por ameaçar colegas nas votações que lhe interessavam.
Apoio político irrestrito ele não reúne nem no PDT. Brizolistas e outros istas vêem a chance de retomar terreno perdido para a Força. O ministro Carlos Lupi (Trabalho) já iniciou a operação desembarque.
A PF não dá pinta de recuo, tão dedicada a vazar o conteúdo do inquérito, e o governo não parece disposto, nesse caso, a mandá-la recuar.
A imprensa também está longe de largar o escândalo. Pudera. Com o abraço da Procuradoria Geral, ele tende a ficar ainda mais escandaloso.
A única sorte de Paulinho é que não há um sucessor no "sindicalismo de resultados" (como ele foi de Medeiros, e este, de Joaquinzão).
A capacidade de mobilização da Força é menor do que o número milionário de filiados sugere (os comícios vivem de shows e sorteios de prêmios). Ainda assim, é um instrumento de pressão poderoso.
Deram a Paulinho uns dias para ele perceber que talvez seja melhor renunciar a Brasília e tentar salvar a influência que o trouxe para cá.

coluna de 31.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Goiabada de mangaba

O ministro Mangabeira está certo quando afirma que a dicotomia motosserra x ambientalismo não traduz a realidade da Amazônia. Tome-se a largada das campanhas municipais na região. Nem se insinua o debate ambiental que, em tese, deveria pegar fogo.
No reflexo, dá vontade de dizer que os políticos caíram reféns dos grandes doadores e por isso ignoram a agenda verde. Ou que são todos farinha do mesmo saco, interessados em se locupletar à custa do agronegócio.
Uma leitura menos superficial não deveria ser descartada, porém. Se não há um governador, prefeito ou candidato de relevância que defenda a preservação incondicional da floresta, talvez seja porque esse tipo de compromisso não dê voto.
A inclusão por meio do consumo (ou a "inflação por demanda") não é um fenômeno restrito aos emergentes das metrópoles do Sudeste.
Por que a Amazônia não haveria de pressionar também por mais carros, cimento, televisores, iogurtes, material escolar e internet?
Ela pressiona, sim, e seus representantes na política também, convencidos de que a plataforma das ONGs (que jogam pelo como-está-fica e sobrevivem da crise) dificilmente atenderá a essas demandas.
Nesta sexta, os governadores se reúnem com Lula para pedir o quê? Mais obras e mais créditos. A mata? O verbo da moda é "manejar", não "conservar".
Mangabeira já havia se posicionado como ouvidor dos militares _para pendências administrativas (salários, equipamentos) e estratégicas (as Forças nem foram consultadas quando a Justiça demarcou a reserva Raposa/Serra do Sol).
Já tinha, também, se legitimado como canal dos ruralistas, insatisfeitos com o Ministério da Agricultura (frouxo, por exemplo, no caso do boicote da carne pela Europa).
Alçado ao papel de formulador para a Amazônia, ele se diz "ignorante", mas engata o primeiro discurso do governo Lula sintonizado com a sede de crescimento e integração da região. Bobo da corte?

coluna de 28.mai.2008

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domingo, 25 de maio de 2008

Fazendo gênero

Uma das manchetes destas eleições municipais será a forte presença feminina. Das dez maiores cidades do país, só em Recife não há mulheres em posição de destaque nas pesquisas ou nas discussões de coligação partidária.
Em São Paulo, Soninha (PPS) é uma pedra no sapato de Marta Suplicy. Com eleitores em comum, deve roubar um ou dois pontinhos que poderão fazer falta à petista.
No Rio, Jandira Feghali (PC do B) e Solange Amaral (DEM) espreitam a chance de enfrentar Marcelo Crivella (PRB) no segundo turno.
Para desgosto do PT, o dito "bloquinho" escalou duas pré-candidatas em Salvador: Lídice da Matta (PSB) e Olívia Santana (PC do B).
A petista Luizianne Lins, zebra em 2004, não quer correr riscos e costura uma série de alianças para garantir mais quatro anos em Fortaleza. Mas falhou na tentativa de convencer Patricia Saboya, que deve se lançar pelo PSB.
Jô Moraes (PC do B) pode acabar como a "anticandidata" ao pacotão suprapartidário que Aécio Neves preparou para Belo Horizonte.
Em Curitiba, Gleisi Hoffmann (PT) separa o tucano Beto Richa da reeleição já no primeiro turno.
Vanessa Grazziotin (PC do B) tenta pela segunda vez em Manaus; Rebecca Garcia (PP), pela primeira.
Um trio de esquerda desponta em Porto Alegre. Manuela D'Ávila (PC do B), Maria do Rosário (PT) e Luciana Genro (PSOL) desafiam, cada uma a seu modo, um novo mandato do peemedebista José Fogaça.
A ex-vice-governadora Valéria Pires Franco (DEM) pinta como um dos nomes viáveis em Belém. No PT, há várias interessadas, mas nenhuma delas obteve a bênção da governadora Ana Júlia Carepa.
O mais interessante dessa notícia é que... não há notícia. Quase todas caminham pelas próprias pernas, independentes de marido, pai ou outro tipo de padrinho. A questão de gênero parece que está sendo superada na política nacional, em número e grau.

coluna de 25.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

Os distritos de Kassab

Ainda pouco reconhecido pelo eleitorado, já que virou prefeito sem ter recebido um voto, Gilberto Kassab precisa do máximo de exposição para fixar uma imagem (por ora não se sabe qual) e grudar o nome à sua administração, em geral bem avaliada pelo paulistano. Mas talvez não seja apenas pelo tempo adicional na propaganda da TV que ele persiga tantas alianças partidárias.
Ao se acertar com PMDB, PR, PV e setores do PSDB, o demista também engaja em sua campanha todas as forças políticas que detêm um naco da máquina municipal.
Kassab desde o princípio compôs com caciques de cada região da cidade. O PMDB pôde preservar áreas de influência na zona sul; o PR, na zona leste... daí por diante.
Isso ajudou o prefeito a: 1) obter a adesão e o silêncio dos vereadores na Câmara (importante para quem caía de pára-quedas); 2) ganhar apoio local a obras ou outras intervenções da prefeitura (fundamental para quem pretendia se consagrar como "gestor"); 3) fazer contraponto às células do PT (ciente de que o partido viria com tudo, e com Marta Suplicy, para retomar a cidade em 2008).
Esse jeito "distrital" de governar, conscientemente ou não, estará associado à campanha da reeleição.
Eventos organizados por um "comitê central", como carreatas e comícios, não surtem em São Paulo o efeito imaginado. O eleitor percebe o descompromisso do aperto de mão, do cafezinho, do discurso.
A presença no dia-a-dia do ator político, ou de um representante dele, é que faz diferença. Uns chamam isso de toma-lá-dá-cá; outros, de administração participativa.
A mudança de perfil da Câmara, com mais vereadores identificados com um único reduto e menos eleitos pelo "voto de opinião", é um sintoma dessa realidade política.
A aprovação a Kassab em franjas da periferia e sua viabilidade eleitoral, para muitos surpreendente, são outros.

coluna de 24.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Boca livre

O Ministério da Fazenda mudou. Antes, preocupava-se com tudo o que dizia, ciente do estrago que uma palavra mal-empregada poderia causar. Hoje, incontinente, não só é pródigo nos comentários como bate recordes de balões de ensaio _idéias que são atiradas ao vento sem que tenham recebido a devida aprovação técnica e/ou política da Presidência.
Não surpreende, portanto, a sucessão de episódios em que o Planalto sai a público para desautorizar sua equipe econômica.
Recapitulando, apenas no último mês, foram descartadas ou devolvidas à gaveta três medidas que tinham sido apontadas como certas pela Fazenda: a restrição ao financiamento dos carros, o aumento das alíquotas do Imposto de Renda e a recriação imediata da CPMF.
No caso do imposto do cheque, Lula deseja, sim, ressuscitá-lo (iria abrir mão de receita?). Mas sob uma condição, sabida desde janeiro: que o Congresso lance a iniciativa e banque o desgaste público. Por que ele, Lula, aceitaria abraçar a "maldade" (ampliar a carga tributária) de um projeto (dar mais verbas para a Saúde) cujo dividendo político ficaria com o Legislativo?
Sobre a compulsão oral da Fazenda, ainda não há explicação definitiva. O jornalismo de hipóteses diria que ministro e assessores:
* são masoquistas e gostam de ser repreendidos pelo presidente;
* se animam com a disputa de bastidores com o Banco Central e tentam de todo modo ocupar espaço na imprensa e no debate público;
* vaidosos, não resistem ao assédio, falando o que lhes dá na telha;
* são gênios da tática e criaram um test-drive para idéias em gestação, a fim de checar sua viabilidade.
O motivo pouco importa, porém. Interessa que, tantas as declarações e tantos os recuos, o mercado ficou calejado. A especulação deixou de se guiar pela Fazenda. Voluntária ou não, essa é uma contribuição da era Guido Mantega.

coluna de 21.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

sábado, 17 de maio de 2008

Marina da glória

Na ânsia de reverenciá-la, rebaixaram Marina Silva a um bibelô. É um tanto paternalista, talvez machista e certamente incorreta a avaliação de que ela colecionou apenas derrotas e humilhações e foi uma vítima indefesa das sabotagens de colegas de governo.
Lula administra tudo com pesos e contrapesos. Põe rivais para brigar, ouve os argumentos, empurra com a barriga e arbitra quando o consenso não surge "naturalmente". Faz assim na área econômica, na diplomacia, na coordenação política. No meio ambiente também.
Marina não se surpreendeu nem se intimidou com esse estica-e-puxa. Pelo contrário. Esticou e puxou as cordas como pôde em seu favor.
Aparelhou o Inpe, órgão ligado a outro ministério (Ciência e Tecnologia), para conseguir o monitoramento em tempo real da Amazônia. Com xiitas ou não, ampliou a fiscalização do desmatamento, que chegou a cair 60% em sua gestão.
Dividiu o Ibama e criou o Instituto Chico Mendes e, com isso, não só acomodou a burocracia verde como multiplicou e reforçou a guarda de áreas de proteção ambiental.
Fomentou a indústria de liminares para frear grandes obras de infra-estrutura e, quando essa opção perdeu eficácia, enfatizou as exigências técnicas. Obrigou a Odebrecht, por exemplo, a melhorar o projeto da hidrelétrica do Madeira.
Não fosse por ela, a transposição do São Francisco teria vazão maior, como desejava o agronegócio. E, mesmo em seu maior revés, o caso dos transgênicos, deixou marca: a indústria perdeu tempo e dinheiro para legalizar algo que já era fato.
Sua renúncia é um movimento político de ataque, não de capitulação. Força Lula a embargar o sinal verde que ele havia dado às motosserras da Casa Civil.
Incensada pela comunidade internacional e agora beatificada pela opinião pública, Marina carregará o bunker para o Senado. Sabe que sempre haverá um microfone para colher seus alertas.

coluna de 17.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Baile fiscal

O governo Lula não sabe cortar gastos e não parece convencido a fazer o sacrifício, ainda que tenha iniciado discussões sobre um ajuste fiscal e abandonado a conversa de que isso fazia parte da "agenda derrotada" em 2006.
Na semana em que revelou a intenção de elevar o superávit primário de 3,8% para até 5%, o Planalto:
* soltou um pacote de incentivos à grande indústria que tira R$ 3,6 bilhões dos cofres públicos no ano;
* correu, certo de que o Supremo vai proibi-lo de manobrar o Orçamento por decreto, para escrever a medida provisória que reajustará o salário de 800 mil servidores (impacto de R$ 2,1 bilhões em 2008);
* amadureceu a decisão de corrigir o subsídio do Bolsa Família, corroído pela inflação da cesta básica;
* abriu mão de quase R$ 3 bilhões em impostos para segurar o preço da gasolina para o consumidor;
* ouviu quieto a base aliada no Congresso anunciar apoio à emenda 29, que aumentará o repasse de verbas federais para a Saúde, ainda órfã dos recursos da CPMF.
Estivesse determinado a apertar o cinto, o governo não incluiria essas medidas na pauta. Nem precisaria vir a público, como veio, reafirmar que PAC, folha de pagamento e programas sociais são intocáveis.
Cabe a pergunta, então: de onde sairá o dinheiro (até R$ 25 bilhões) para garantir a nova meta fiscal?
Erra quem acredita que emendas parlamentares pagarão a conta. Encerradas as eleições municipais, o Planalto será forçado a repactuar as alianças para 2010. Não poderá tirar o doce da boca do Legislativo.
Ao que tudo indica, Lula está dobrando a aposta no crescimento "espontâneo" da economia (a arrecadação já roda superávit de 4,4%) e fazendo uso oportunista de um discurso oportuno, só para evitar que os juros continuem a subir.
A idéia de um superávit maior é antes um afago em um Banco Central preocupado com a inflação do que um compromisso genuíno com o corte de despesas correntes.

coluna de 14.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

sábado, 10 de maio de 2008

Aprecie com moderação

A cara de tacho do senador Agripino Maia ficou para a história. A lição de moral de Dilma Rousseff, sobre o direito de mentir na ditadura e o dever cívico de falar só a verdade na democracia, não.
Sabe-se agora que, quando falou ao Senado, a ministra estava ciente das conclusões da Polícia Federal e da sindicância interna. A planilha de 28 páginas com uma edição comentada de gastos de FH e Ruth Cardoso havia sido encontrada. Estava na lixeira de um computador da Casa Civil. Tinha sido produzida no Planalto, conforme antecipado pela Folha, e de lá sido vazada para a oposição, por e-mail, por um servidor do ministério ligado ao PT.
Na quarta-feira, porém, Dilma aplicava o sermão e repetia: "Não há dossiê, há banco de dados".
A quem já perdeu a paciência ou não põe fé neste escândalo de uso político de recursos do Estado pela Casa Civil, recomenda-se outro, distinto na natureza, mas similar na condução nada transparente.
Depois de quatro anos de debates, o governo lançou em 2007 a Política Nacional do Álcool, com o objetivo de reduzir o consumo de bebidas, suas conseqüências para a saúde e sua associação com a criminalidade. Mandou ao Congresso um corajoso projeto de lei para regulamentar a propaganda e incluir a cerveja na lista da fiscalização.
De cara, surgiu a suspeita de que tudo não passava de um blefe para manter nas cordas as emissoras de TV, que perderiam muita receita com a mudança. O Planalto rebateu. Afirmou que era sincero o compromisso de "proteger a população" e empenhou a palavra em cartilha enviada aos deputados.
Na quarta-feira, quando enfim a proposta entrou na pauta de votação da Câmara (e Dilma dava o baile no Senado), o QG político do governo avisou que desistia do pedido de urgência. O projeto que incomodava as TVs foi jogado na vala comum das centenas que se arrastam no Legislativo, praticamente sepultando suas chances de aprovação.

coluna de 10.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Café-com-leite

Não parece muito prudente afirmar que Aécio Neves e Geraldo Alckmin estarão no mesmo time para o que der e vier.
Em primeiro lugar, há a incompatibilidade de gênios. Um não costuma fechar questão com este ou aquele grupo, basta notar o tamanho e a heterogeneidade da coalizão que o apóia em Minas. O outro, ensimesmado, não tolera o rame-rame da política. Não sabe costurar acordos, nunca desejou fazê-los.
(É interessante, aliás, como eles transformam essas características opostas em trunfos eleitorais. Aécio, o "homem do consenso"; Alckmin, o "administrador apolítico".)
Em segundo lugar, existe uma ferida aberta na relação entre os dois. O paulista não esquece que sua candidatura à Presidência em 2006 foi fortemente sabotada pelo governador mineiro no segundo turno.
Finalmente, para ocupar mais e melhores espaços em São Paulo, os alckmistas sabem que terão de acenar em algum momento para José Serra _o candidato a presidente ou o candidato à reeleição no Estado.
Mas há um fator que se sobrepõe e força a aliança tática, ainda que momentânea, entre o neto de Tancredo e o ex-governador paulista.
Os seis anos à frente do maior Estado da federação (com alto índice de aprovação) e a campanha que o projetou nacionalmente em pouco tempo viraram pó: Alckmin hoje tem de implorar uma nova chance.
Aécio olha a má situação do colega tucano e se pergunta. Quem garante que não perderá o embalo daqui até 2014? Vale o risco de ficar no Senado enquanto outras forças (o PT, sobretudo) se mexem em Minas, as mesmas que hoje se dispõem a colocá-lo no Planalto? Vale a pena desprezar a ausência de Lula em 2010 e esperar que a "fila ande"?
Quando peita o PSDB e impõe seu nome à Prefeitura de São Paulo, Alckmin joga indiretamente por Aécio, portanto. Faz uma espécie de ensaio da colisão frontal com Serra que ao mesmo tempo seduz e amedronta o governador mineiro.

coluna de 07.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

sábado, 3 de maio de 2008

Metatarso

O Ministério da Justiça já tinha virado escritório de advocacia do Planalto e produzido linhas de defesa inesquecíveis, como a que reduziu os pagamentos do mensalão a "repasses de contribuições de campanha não declaradas". No segundo mandato, vai além. Antes de rebater o conteúdo das acusações, desqualifica-as com um estranho exercício de lógica: o que não está explicitamente tipificado nas leis e estatutos não só não é crime como é perfeitamente legítimo.
A fórmula deu as caras na evolução das versões para o dossiê: 1) não foi feito levantamento dos tucanos; 2) as informações são reais, mas o que está na praça é um catatau apócrifo; 3) dossiê é "conceito" político, e nada com esse viés foi fabricado pelo governo; 4) montou-se um dossiê no Planalto, mas à revelia dele, talvez por um espião; 5) funcionários da Casa Civil podem ter formatado o dossiê, mas há ilegalidade somente no vazamento de gastos sigilosos; 6) a lei não proíbe o governo de juntar dados para o embate político; 7) não há crime na divulgação, pois nada estabelece que as despesas de FHC ainda ofereçam riscos à segurança nacional.
O rocambole surgiu também nas explicações dos grampos na Câmara. Ao chiar, o presidente Arlindo Chinaglia ouviu do ministério: 1) o Congresso não foi espionado; 2) a PF filmou, sim, mas só "áreas públicas"; 3) não há nada escrito que impeça a polícia de entrar. Por aí vai.
Não se considerou a autonomia do Legislativo. Quem ousará "conspirar" contra o Executivo diante do risco de se ver monitorado por agentes que trabalham para ele?
Nem o grave precedente. A PM poderá entrar sem aviso também?
Tarso Genro perdeu posições no hit parade da corrida presidencial para outros ministros do PT (Dilma, Haddad, Patrus, Marta). Mas não perdeu a esperança. O "neolegalismo" que descarta o bom senso, as convenções e os compromissos republicanos é resultado de seu empenho para mostrar serviço.

coluna de 03.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br