sábado, 3 de maio de 2008

Metatarso

O Ministério da Justiça já tinha virado escritório de advocacia do Planalto e produzido linhas de defesa inesquecíveis, como a que reduziu os pagamentos do mensalão a "repasses de contribuições de campanha não declaradas". No segundo mandato, vai além. Antes de rebater o conteúdo das acusações, desqualifica-as com um estranho exercício de lógica: o que não está explicitamente tipificado nas leis e estatutos não só não é crime como é perfeitamente legítimo.
A fórmula deu as caras na evolução das versões para o dossiê: 1) não foi feito levantamento dos tucanos; 2) as informações são reais, mas o que está na praça é um catatau apócrifo; 3) dossiê é "conceito" político, e nada com esse viés foi fabricado pelo governo; 4) montou-se um dossiê no Planalto, mas à revelia dele, talvez por um espião; 5) funcionários da Casa Civil podem ter formatado o dossiê, mas há ilegalidade somente no vazamento de gastos sigilosos; 6) a lei não proíbe o governo de juntar dados para o embate político; 7) não há crime na divulgação, pois nada estabelece que as despesas de FHC ainda ofereçam riscos à segurança nacional.
O rocambole surgiu também nas explicações dos grampos na Câmara. Ao chiar, o presidente Arlindo Chinaglia ouviu do ministério: 1) o Congresso não foi espionado; 2) a PF filmou, sim, mas só "áreas públicas"; 3) não há nada escrito que impeça a polícia de entrar. Por aí vai.
Não se considerou a autonomia do Legislativo. Quem ousará "conspirar" contra o Executivo diante do risco de se ver monitorado por agentes que trabalham para ele?
Nem o grave precedente. A PM poderá entrar sem aviso também?
Tarso Genro perdeu posições no hit parade da corrida presidencial para outros ministros do PT (Dilma, Haddad, Patrus, Marta). Mas não perdeu a esperança. O "neolegalismo" que descarta o bom senso, as convenções e os compromissos republicanos é resultado de seu empenho para mostrar serviço.

coluna de 03.mai.2008

mfilho@folhasp.com.br

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