terça-feira, 26 de maio de 2009

Separação de corpos

A Câmara deu um passo relevante ao aprovar o projeto de emenda constitucional que facilita o divórcio, e não apenas pelo interesse que o assunto desperta ou pelo avanço que o texto representa. Depois de muito tempo, o plenário votou algo que nasceu e foi burilado dentro do Congresso, sem a intervenção direta do Planalto.
Desde 2001, as medidas provisórias enviadas pela Presidência dominam a pauta, quando não bloqueiam totalmente os trabalhos do Legislativo. No Senado, elas trancaram 70% das sessões deliberativas no segundo mandato de Lula.
Quando o Congresso esboçava alguma agenda própria, ela logo sucumbia à ditadura das MPs e acabava na gaveta. A Câmara tem hoje 2.000 projetos prontos para votar.
Aos plenários restou chancelar as vontades do governo ou entreter as câmeras de TV. Comissões temáticas perderam sentido. Audiências públicas passaram a ser realizadas só para reunir velhos conhecidos.
A situação chegou a tal ponto que, em dezembro, o presidente da Câmara se espantou ao notar que uma comissão apreciaria um projeto que ele mesmo havia redigido dez anos antes _e do qual nem ele se lembrava.
(Não à toa, as duas Casas se tornaram descartáveis até para lobistas, mais atentos à Casa Civil, de onde são disparadas as MPs.)
Em março, porém, achou-se uma saída jurídica: somente a pauta das sessões ordinárias seguirá trancada pelos decretos presidenciais.
Não seria prudente depositar demasiada esperança no sprint "autoral" de um Congresso cujos líderes fizeram carreira política em submissão ao Planalto _para não falar na ausência de resposta digna do nome aos escândalos recentes.
Eles próprios hesitam em fazer uso do novo entendimento, apesar dos sinais de endosso do Judiciário.A reforma política, por exemplo, prossegue no vai não vai.
Mas o sucesso da PEC do divórcio de certo modo levantou o teto do Legislativo, e isso é um avanço.

coluna de 26.mai.2008

melchiades.filho@grupofolha.com.br

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