sábado, 3 de novembro de 2007

Concorrência brutal

O relatório da CPI do Apagão Aéreo traçou o roteiro do crime: 1) quadrilha com influência e/ou ramificação no governo inclui obras na lista de projetos do Executivo ou toma conhecimento prévio deles; 2) dá um jeito de ampliar as exigências técnicas da licitação com o objetivo de alijar a maioria dos concorrentes potenciais (no caso da Infraero, o número caía de milhares para uma dúzia); 3) negocia o preço (superfaturado) da obra com os escolhidos em troca de comissão; 4) usa a propina supostamente em campanhas eleitorais.
Não é coincidência que um projeto de lei legitimador desse mecanismo tenha chegado ao plenário simultaneamente ao texto da CPI. O objetivo foi reunir no mesmo time os que tentam poupar Carlos Wilson & Cia. das investigações da Infraero _sobretudo impedindo que eles esclareçam se havia ou não um braço mensaleiro na estatal_ e os que simplesmente buscam perpetuar os vícios nas concorrências.
O projeto em discussão no Senado estabelece justamente o contrário do que pretendia o relator, Eduardo Suplicy (PT-SP). A idéia original previa, primeiro, selecionar o vencedor pelo orçamento mais baixo e, depois, conferir se ele teria condições técnicas para tocar a obra.
A fim de peneirar aventureiros e antecipar batalhas judiciais entre candidatos (tentariam desqualificar uns aos outros antes da licitação, e não durante ou depois), poderia ser criado um cadastro prévio de fornecedores aos governos.
Além de eliminar gargalos, esse pacote fortaleceria a disputa de preço nas concorrências e coibiria acertos de contas antecipados.
Tudo isso, porém, acabou desvirtuado ao longo da tramitação.
O relatório da CPI sucumbiu ao trator do Planalto (houvesse mirado também em gestões anteriores à de Wilson, o desfecho poderia ter sido outro). Cabe agora ao Senado, que só faz adiar a prometida volta por cima pós-Renan, resgatar e garantir os avanços do projeto de lei.

coluna de 03.nov.2007

mfilho@folhasp.com.br

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