domingo, 20 de maio de 2007

Divisão intermediária

Falam que o presidente se regozija da ligação direta que estabeleceu com os eleitores, que se julga maior do que o PT, que não aceita os partidos como legítimos representantes da população, que a esse menosprezo se deve o embaço da reforma ministerial.
Dizem que ele nunca deixou de ver o Congresso como "os 300 picaretas", que por isso não se engajou em grandes projetos legislativos, recorreu à avalanche de medidas provisórias e mensalões e instituiu com o Parlamento uma relação tão unilateral que até a bancada de seu partido acabou se amotinando.
Afirmam que Lula não reconhece o papel mediador da imprensa, que ele, dependendo da conveniência, ora a rebaixa ("foi ignorada pelas urnas"), ora a mitifica ("manipulou o país" com a foto do dinheiro-não-se-sabe-de-onde-veio), daí continuar negando entrevistas.
Alarmam-se com o governo que se diz democrata, mas que não titubeia antes de rejeitar os clamores públicos cheios de emoção (só valem se interessarem a seu plano de poder) ou de apontar os limites da "representação política tradicional".
Alertam para a idéia de "radicalização democrática" que nasce com fronteira definida: os que exercem a "cidadania ativa" (?).
Reclamam que o Bolsa Família é dinheiro na veia do eleitorado, para usar a metáfora da Casa Civil.
Mas ainda não repararam na arapuca armada pelo PAC, o pacote que carimba toda obra com o selo federal, que acaba com o reparte de dividendos políticos, que enterra o costume do brasileiro de achar bom o prefeito (governador) que arranca verbas e traz o governador (presidente) para a inauguração.
Talvez por isso o Planalto não tenha esquentado a cabeça com a largada lenta do pacote de aceleração. Meia dúzia ou uma dúzia de obras, tanto faz. O presidente cortará a fita de cada uma delas e poderá dizer que o governo dele é bom _com ênfase no "dele", como de hábito.

coluna de 28.fev.2007

mfilho@folhasp.com.br

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